A Menina

Corpo caído, braços abertos. Da moça menina sua idade quem sabe, talvez debutante; agora só uma curiosa postura como que olhando para o alto.

A visão incomoda. Jovem, longe da maturidade que não mais chegará, abandonada ao olhar curioso de gente que secretamente se apavora, e se alegra, com quem morre assim.

Como não pensar. Quais seriam seus planos, seria fundamental ou média sua escola? Quem sabe. A vida estava só começando, e já terminou. Por quê lhe fizeram assim? Tantas perguntas que não mais serão respondidas. E nem importa mais.

Corpo manchado pelo que lhe dava a vida, na face, marcas não contidas da violência brutal. Desenhos à luz, anotações, quem quererá guardá-las. Indiferença é só mais uma menina morta, quem sabe lá por quem e por quais motivos. Aqueles que a recolhem, recolhem aquilo que foi a menina e que já não é. Não parece lhes importar é só mais uma menina entre tantas que comporá a fúnebre rotina do seu dia.

Mãe que desespera, outra que busca. Essa volta aliviada – dessa vez não foi sua menina. Àquela nenhum consolo é possível, não lhe servem palavras de amigos ou parentes. Não, não servem. É a sua menina, não importa se malcriada, é a sua menina na calçada por onde não mais quererá passar, nunca mais. Não mais afagá-la, não mais abraçá-la entre uma malcriação e outra, coisa de mãe e filha.

Pai, em silêncio lamenta, parece não chorar encostado ao balcão do bar. Quem lhe poderá recolher as lágrimas do coração que não serão vista por ninguém. Suspira, essa menina, essa minha menina.

Procuro passar rapidamente entre a multidão pareço querer evitar o óbvio, a confrontação retinal, impossível. Pai que cala, mãe que desespera, olhos que curiosamente querem. As ações dos que recolhem e a imagem que fica – a menina de braços abertos em um passeio qualquer da avenida pela qual não mais andará.

Então, eu fui almoçar.